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Review: novo disco da Scalene é inovador, revigorante e surpreendente

Scalene lança o disco Respiro (Foto/Breno Galtier)

Scalene completa 10 anos com disco diferenciado (Foto/Breno Galtier)

Formada por Gustavo Bertoni (voz/guitarra), Tomás Bertoni (guitarra/violão/vocais), Lucas Furtado (baixo/vocais) e Philipe Makako Nogueira (bateria/vocais), a banda brasiliense Scalene está há 10 anos de estrada. Bastante produtivo, o quarteto já lançou cinco álbuns de estúdio, quatro EPs e um disco ao vivo.

Em julho deste ano, os caras lançaram o disco Respiro. Com 13 faixas autorais, o álbum definitivamente apresenta uma nova fase no trabalho da banda. As canções apresentam arranjos menos pesados e mais ensolarados. É como se o stoner rock e o post-hard core saíssem um pouco de cena e dessem lugar às sonoridades próximas da música brasileira popular. As inovações, no entanto, não apagaram os traços de intensidade e o lado existencial do DNA das letras.

Respiro é o disco mais diferente da carreira da banda Scalene

Respiro é o quinto álbum de estúdio da banda Scalene (Divulgação)

Respiro já começa com novos ares: o inconfundível bandolim de Hamilton de Holanda, um dos músicos mais bem conceituados do lado de cá da Linha do Equador, na faixa Vai Ver. Essa espécie de neo samba pop é uma das canções de amor mais singelas dos últimos tempos.

Se você já ouviu por aí que o pop rock nacional perdeu o senso crítico, a letra da Ciclo Senil precisa ser um mantra na sua vida. Com versos incisivos, palavras diretas e questionadoras, essa música serve para colocar as pessoas mimadas [“Você quer mudança, mas não quer ter que mudar também”], os ativistas de redes sociais [“Você quer distância para não ter que sujar as mãos”] e os egocêntricos e/ou ególatras [“Pede tolerância, mas não quer ter que escutar ninguém”] em seus devidos lugares.

Lembra da proximidade do disco Respiro com elementos da música brasileira que pontuei linhas acima? Você pode confirmar esse sentimento quando for seduzido pela ginga dos violões e malandragem do sambinha maroto presente na quase tribal Tabuleiro. Por sua vez, o espírito da bossa nova é resgatado na canção Ilha No Céu – que conta com a flauta de Beto Mejía [ex-membro da extinta Móveis Coloniais de Acaju] -, uma canção que reflete sobre as dores e delícias das questões quem envolvem a evolução do indivíduo em seu âmbito familiar.

Genialidade de Ney Matogrosso entre dois membros da banda Scalene

Genialidade de Ney Matogrosso não ofusca talento da Scalene (Foto/Facebook)

O momento mais intenso do disco é a faixa Esse Berro, que marca o encontro musical da Scalene com Ney Matogrosso – um artista que dispensa qualquer apresentação. O dueto de Gustavo e Ney provoca uma experiência sensorial que clareia o mais escuro dos dias. De quebra, a sutileza de um impecável arranjo de cordas faz com que essa música tenha o poder de aquecer qualquer coração gélido.

Com participação da talentosíssima Xênia França, a faixa Furta Cor é a prova de que pensar fora da caixa só traz benefícios para um artista. Para conseguir fazer um bom trabalho fora da zona de conforto, no entanto, é preciso acertar nas escolhas das parcerias e das canções. Disso tudo, felizmente, a Scalene entende muito bem. A combinação de vozes funciona muito bem, a letra é uma autoanálise perfeita e o arranjo é uma das produções mais diferentes no extenso catálogo da banda.

Por fim, mas não importante: normalmente, uma banda celebra uma data importante de sua trajetória com um disco vivo e/ou acústico, ou um trabalho de releituras ou até mesmo uma coletânea com duas faixas inéditas. Nadando contra a corrente, no entanto, a Scalene optou por um projeto longe dos conceitos revisionistas.

Só que além inovador, autoral e totalmente inédito, Respiro é um trabalho instigante, ousado e revigorante. Trata-se de um álbum que precisa ser ouvido e valorizado desde já, pois certamente resistirá ao teste do tempo. Que fique a lição para os medalhões do rock nacional.

Foto de Gustavo Morais

Gustavo Morais

Jornalista, com especialização em Produção e Crítica Cultural. Pesquisador independente de música, colecionador de discos de vinil e mídias físicas. Toca guitarra, violão, baixo e teclado. Trabalha no Cifra Club desde novembro de 2006.

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