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Aprenda o que é trítono na música

Descubra o que é trítono, também conhecido como “o som do diabo”, sua história e como ele atua na prática.

“O diabo na música”, “o intervalo proibido”, “O intervalo do diabo”. É dessa forma que é conhecido um importante intervalo: o trítono. Mas o que é trítono na música, para além de sua fama?

O trítono é um intervalo musical importante, com uma sonoridade e propriedades bem particulares.

Para os que se aprofundam em teoria musical, harmonia e até história da música é impossível escapar de falar de sua importância e do desenvolvimento do seu uso ao longo do tempo.

O que é trítono? Conheça sua história e função

Hoje você poderá descobrir o motivo do trítono ser um intervalo tão instigante e se ele realmente foi proibido pela igreja católica.

Primeiro, você vai entender o que é o trítono na teoria e depois desvendar a sua história. Se prepare e vamos lá!

O trítono na teoria

O trítono é um intervalo musical que contém 6 semitons ou 3 tons. Daí vem o nome trítono, “três tons”. Portanto, se uma escala cromática possui 12 semitons ou 6 tons, o trítono é o intervalo que divide essa escala pela metade.

Dentro da teoria musical esse intervalo é categorizado como uma 4ª aumentada ou 5ª diminuta. A classificação correta vai depender do contexto harmônico e do nome das notas já que, na prática, o intervalo é simétrico, ou seja, ele sempre soará como um trítono.

Um intervalo ascendente entre a nota Dó e a nota Sol, nessa ordem, soará como uma 5ª justa. Agora, se invertermos a ordem e o intervalo ascendente for entre Sol e Dó, teremos a sonoridade de uma 4ª justa.

Agora, um intervalo ascendente entre as notas Fá e Si terá a mesma sonoridade de trítono se a ordem das notas for invertida para Si e Fá. Isso acontece pois ambas são separadas por três tons.

intervalo ascendente entre as notas Fá e Si
Créditos: Reprodução

Em termos de som, o trítono é uma dissonância. Essa sonoridade se tornou um elemento central dentro da estruturação do Tonalismo, principalmente a partir do século XVIII.

Nesse contexto, o trítono serve para criar uma sensação de tensão nas músicas que polariza um determinado acorde. Esse uso é mais comum no encadeamento entre o acorde de V7 (dominante) e I (tônica).

Durante décadas, a resolução desse intervalo deveria sempre ser feita com a terça do acorde da dominante subindo para a tônica, e a sétima do acorde da dominante descendo para a terça do acorde de tônica, como você pode observar no exemplo.

exemplo de trítono
Créditos: Reprodução

“Diabolus in Musica”: a teoria sobre o Trítono

Há um mito que a Igreja Católica teria proibido o uso do trítono nas composições musicais devido à sua sonoridade terrível, associada ao diabo. Daí viria o nome “Diabolus in Musica”.

Entretanto, não há nenhuma prova documental que embase essa informação. Na verdade, a evidência musical é oposta

Podemos citar como exemplo a música Viderunt Omnes, de Perotin, datada do século XIII. Esse é um tipo de polifonia chamado de organum.

Mais curioso ainda é que músicas com trítonos aparecem em uma composição do francês Guillaume de Machaut, a Missa de Notre Dame. Nessa obra do século XIV, o trítono aparece diversas vezes como intervalo melódico.

Mas é verdade que ele foi chamado de “Diabolus in Musica”. Só que esse registro data de 1702, séculos após o fim da Idade Média, escrito pelo músico e teórico Andreas Werckmeister, no tratado Harmonologia Musica, e não mencionava uma “proibição”.

Provavelmente, essa afirmação se referia à dificuldade de cantar o intervalo de trítono e à sua sonoridade dissonante, não a aspectos espirituais ou diabólicos. Isso não quer dizer que o trítono não tenha, de fato, sido associado a sentimentos e sensações ruins ou dolorosas.

Um exemplo com o trítono é a Cantata Actus Tragicus, de Bach. O tema da fuga “Est ist der alte bund“ possui um trítono melódico, enfatizando o texto que fala sobre a necessária morte da humanidade.

É inegável que a história do trítono está intimamente ligada com o desenvolvimento da música popular e clássica do ocidente. De certo ponto de vista, podemos dizer que a história da música até o século XX é a história da emancipação do trítono.

O uso do trítono na música

Agora vamos ver alguns exemplos do uso do trítono em outras músicas. Esse intervalo aparece em diversos gêneros, desde o jazz até o rock.

Música clássica

Com o desenvolvimento da música tonal e a expansão das possibilidades da harmonia, o trítono começou a ser explorado de maneira mais consciente. Compositores como Beethoven e Wagner o utilizaram para criar tensão dramática e expressiva em suas obras.

Richard Wagner, inclusive, se tornou famoso pelo uso de um acorde específico que possui uma quarta aumentada. Conhecido como “Acorde de Tristão”, referência à ópera Tristão e Isolda, ele pode ser ouvido logo no início do prelúdio.

Essa música foi trilha do filme Melancolia, de Lars Von Trier, reforçando toda a relação do trítono com sensações de sofrimento e angústia.

Mais tarde, compositores como Arnold Schoenberg e Anton Webern deram ao trítono um papel fundamental dentro do dodecafonismo.

Blues e jazz

Na música popular, o trítono se tornou tão importante quanto na música de concerto.

Por exemplo, os encadeamentos tradicionais de blues, todos com acordes com sétima menor (X7), possuem o trítono em sua estrutura de tétrades. Como em Folsom Prison Blues, de Johnny Cash.

No jazz e na música instrumental, o trítono serviu de base para a exploração de novas harmonias e escalas.

MPB

Na música brasileira, um exemplo do uso do trítono é a canção Desafinado, de Tom Jobim e Newton Mendonça.

Quando a letra diz “se você disser que eu desafino”, o intervalo é cantando não é um trítono mas é uma 4ª aumentada com a fundamental da harmonia. O acorde é um G7(11+). Não é uma desafinação e, sim, uma dissonância!

Rock e heavy metal

Se o mito diz que o trítono é o intervalo do diabo, nada mais natural que ele também fosse associado à “música do diabo”: o rock.

O exemplo clássico é a música Black Sabbath, do disco homônimo da banda, que se inicia com um trítono em meio a trovões e uma atmosfera sombria.

Antes do Black Sabbath, Jimi Hendrix já havia utilizado esse intervalo em Purple Haze, música de abertura de seu disco Are you Experienced, de 1967.

Outros exemplos no rock incluem YYZ, do Rush, e Painkiller, do Judas Priest.

Como identificar o trítono no instrumento

O trítono, como já mencionado, é o intervalo de três tons ou seis semitons. Para identificá-lo no seu instrumento é muito simples.

No piano ou teclado, é só você localizar duas notas que tenham sete teclas de distância. Ou seja, de Dó a Fá# você tem:

  • Dó, Dó#, Ré, Ré#, Mi, Fá e Fá#

No violão e na guitarra, o intervalo pode ser encontrado seguindo as formas, que podem ser usadas como partes de diferentes acordes:

tablatura acordes
Créditos: Reprodução

O trítono está ligado com o desenvolvimento da linguagem musical do ocidente. Saber de sua história e como usá-lo é se abrir para um mundo de possibilidades harmônicas e melódicas.

E ainda há mais para aprender sobre teoria

Se você curtiu descobrir o que é trítono, preparamos outros 7 assuntos de teoria musical que você deve aprender! Nos vemos por lá.

Foto de Marco Teruel

Marco Teruel

Marco Teruel é músico e violonista, com mestrado pela USC Thornton School of Music (EUA) e doutorado em música pela UFMG. Seus interesses musicais incluem o repertório do violão clássico, a música dos séculos XVI e XVII, a música brasileira e o heavy metal.

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